Tango a Tantos
A madrugada começou escarlate com o sol a nascer no meio da serra. Lembrava-me de tantas coisas.
Senti dentro de mim uma canção, a voz dela a escorrer pelas minhas mãos e a desembocar nos lábios que a murmuravam. Tentei encontrar a letra da canção, mas não consegui; fica o fragmento que mais me toca.
"How many accidents can a single person have?"
Repetia-se esta frase dentro de mim com uma insistência indicativa de que lago tem que mudar. Não por ser ano novo, mas porque está na altura de mudar. Voltei a olhar para a rua: a nuvens já não eram escarlates, o sol estava mais alto e o céu tingido de um cinzento e azul, uma manhã de sabor cálido, mas fria. Enrolei-me mais dentro do saco-cama, estava com tanto frio. Deixei de murmurar, mas cantava para dentro.
Lembrei-me do trailer do "Personal Velocity", o filme que deu nome a este blog, lembrei-me do fascínio que tenho por uma das actrizes, a Parker Posey.
Fiquei a olhá-la, pela porta entreaberta entrava um vento. Sabia que já não ia dormir mais, não interessava. Da sala ao lado, a da lareira, já vinham vozes ensonadas. Fui ter com eles, sentei-me em silêncio a olhar para as chamas. Voltei a pensar na Parker Posey e nos acidentes.
A arrumação foi rápida, em pouco estávamos dentro dos carros a voltar. Ainda houve uma tentativa de café, mas não resultou. Em casa comi duas torradas. No rádio da cozinha está um álbum que lá deixei propositadamente.
Ele cantava
"É a dança mais punjente
Mão atrás e outra à frente
Valsa de um homem carente
Mão atrás e outra à frente."
Mais a Parker e os acidentes.
2 Comments:
Sei que já te disse isto mas, é incrível como sempre consegues fazer-me arrepiar com aquilo que escreves. As imagens que pintas com as tuas palavras, levam-me à raiz de cada cor, de cada pulsar de electricidade pelo meu corpo. Cada vez mais acho que não existe cafeína suficiente para matar a sede que vou tendo das tuas palavras.
Sei que já te disse isto antes mas, a forma como escreves toca-me. A imagens que pintas com as tuas palavras, lembram-me a aurora boreal. Não começam nem terminam, existem num espaço perpétuo do deslumbre.
Temo que não haja cafeína suficiente para matar a sede que tenho das tuas palavras.
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