Sete Notas Soltas
Revejo-me aqui à três meses atrás.
Subo, com um escadote, para um pedestal límbico. Sou agora deus-omnipotente-omnipresente; olho para mim com menos três meses, olho para mim agora. Não deixo de esboçar um benévolo sorriso, como bom deus que sou. Mudei muito, mas tê-lo-ei notado? Não, longe disso. Fizeram-mo notar? Também não; mentira, talvez um pouco, de há três semanas para cá.
As pessoas mudam, eu quero acreditar que sim. Tenho pensado muito nisto. A mudança que se processa no dia a dia não é notada, porque é mínima, quase irrisória. Nota-se em grandes espaços de tempo. Sou deus, olho para a frente e para trás, faço analepses e prolepses e tudo sei.
Olhando para trás, dois, três, quatro meses, verão que todos mudámos. Uns mais rapidamente porque acharam que era altura de mudar, outros sucumbem à inércia do conforto ilusório, aquele que nos adia o futuro. Custa-me ver pessoas sucumbirem dessa forma, a deixarem-se perecer; custa-me porque são pessoas de quem muito gosto e sabendo que eu próprio estive já sob o poder dessa inércia, sei o que dela custa libertarmo-nos.
Estou com a perspectiva de duas semanas em Berlim; já vi uma exposição muito boa (www.pier-der-wissenschaft.de) e espero continuar a encher-me de cultura até transbordar. Porque, para quem como eu, vive em Portugal, às vezes são preciosas estas lavagens de alma.
Acordei e vi os mais lindos olhos a velar pelo meu sono, olhos verdes e profundos. Domingos não são dias para passar em casa; gosto de passear de chinelos e calças de ganga rotas, gosto de passear e sentir a mão que segura a minha, gosto de me deitar na relva e sentir que usaram a minha barriga como almofada (suponho que seja confortável – lá fofinha é).
Espera-me um jantar de sushi e sopa miso. Não é só uma lavagem de alma, é também de paladar.
(E agora, em crescendo, o final de guitarra do “I Want Wind to Blow” dos The Microphones).
1 Comments:
...sucumbiste aos simples prazeres da vida. simples mas grandiosos, não é? sim é retórica esta pergunta!!
; )
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