Sunday, October 02, 2005

Dez anos de diferença

A primeira vez que pensei que podia ser escritor tive medo: e se um dia se me esgotassem as ideias? Na altura tinha umas quantas e com medo que me fizessem falta um dia mais tarde (passados uns dias já nem sequer me lembrava do sucedido, já nem sequer pensava que gostaria de escrever). Acima de qualquer coisa, tinha medo que me viesse o chamado bloqueio de escritor, assim nos ensinam os filmes norte-americanos. Acontece que desde essa altura até agora, nunca me tinha decidido a ser escritor, portanto nunca tinha tido o bloqueio de escritor.
Desde a primeira vez que pensei em ser escritor até agora, passaram dez anos. Entretanto não me tornei escritor, mas escrevo muito. E da mesma forma que nunca senti ímpetos de inspiração também nunca senti bloqueio de escritor. Acho que no fundo o processo criativo deve ser encarado como um acumular de experiências que nos leva a um lugar onde nunca ninguém esteve antes: ou então leva-nos a um lugar onde já está muita gente, mas numa perspectiva que nunca ninguém viu.

Como grande parte das reflexões que faço, era de noite e ia a guiar. Suponho que a criação esteja directamente ligada à sensibilidade, às diferentes formas que temos de absorver o que nos rodeia e o que nos sensibiliza.
Lembro-me, no meio de um deboche alcoólico, argumentar sobre processos criativos. Alguém defendia que para fazer arte era necessário noventa e oito por cento de criatividade e apensa dois por cento de trabalho; na altura fiquei a pensar naquilo, sem emitir opinião. Parece-me agora noventa e oito por cento de trabalho e dois por cento de criatividade.
Porque entretanto passaram dez anos, não me tornei escritor mas escrevo muito. E não tenho ímpetos de inspiração nem bloqueio de escritor

3 Comments:

Blogger M said...

Lembro-me de uma noite em que entre macieiras e minis me disses-te que tinhas um livro escrito.
Lembro-me de uma noite em que me disses-te que antes escrevias quando estavas triste, quando as emoções eram maiores que o teu peito e que na realidade escrevias mal, quando assim era.
Lembro-me de me teres dito que quando começas-te a escrever, como actividade diária, tal como um emprego que se tem das 9hás5h, passas-te a escrever melhor...bem melhor.
Lembro-me de tudo isso...agora quero lembrar-me do dia em que hei-de comprar na Fnac o teu primeiro livro... Despacha-te

5:25 PM  
Blogger Alberto Oliveira said...

Não será bem "sorte de principiante", porque se já escreves há dez anos e nunca tiveste o "bloqueio de escritor de que se fala nos filmes americanos"... É sorte, prontos!

Vou fazer-te uma confissão (coisa que seria impensável fazê-lo na blogsfera há meia-dúzia de dias, mas agora garantiram-me que há um truque para apenas tu, teres acesso a este comment...
Comecei a escrever quando iniciei o meu blog; é que nem cartas comerciais eu redigia. Um belo dia sentei-me frente ao pc e "quase sem dar por isso" escrevi uma história. Os familiares e amigos quase que me levavam em ombros à editora mais próxima. Tive de lhes travar o entusiasmo. Primeiro post, primeiro "bloqueio de escritor" (sem o ser...) E assim tem sido; post sim, post não, um "bloqueio de escritor", ou seja: se já editei cerca de trinta posts, já "me passaram pelas mãos", quinze "bloqueios de escritor"...

6:12 PM  
Blogger Joana said...

Er...Desde que puseste este post que ando aqui às voltas com ele. Venho, vou, volto, leio e releio...gosto, volto a ir, volto a ele....Acho que estou bloqueio de comment!!!

3:20 PM  

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