Wednesday, June 29, 2005

Perigo de Explosão

O meu voo é daqui a alguns minutos. Voar de avião nunca foi das coisas que mais gostei de fazer; gosto da descolagem, do impulso que nos encosta à cadeira, com a força das turbinas.

Estava perto da porta de embarque, divagando teorias da conspiração. Olhei, porta de embarque, C7. Será algum parente ainda mais violento do explosivo C4? É de certeza um sinal da minha morte próxima, o desvio que o avião fará até Beirute e onde explodirá e o atentado será reivindicado por algum grupo extremista que luta por uma qualquer causa que a eles lhes parece justa e a outros não e depois far-se-ão imensas manifestações porque morreram cidadãos europeus inocentes que em nada podiam contribuir para beneficiar a sua causa só mesmo para a prejudicar.

Mas não, que eu saiba, o C7 não é mais poderoso que o C4 e nem sequer é explosivo. Vou chegar bem, cansado da viagem e sem nenhuma peripécia para contar, porque desta vez o voo é directo e não devo perder as malas.
Mas se não as perder, o que é que me acontecerá então?

Tuesday, June 28, 2005

O Algarve está podre e tresanda

Comecei as minhas férias de Verão com um passeio de quase-seis-horas ao longo do Alentejo até ao Algarve dentro de um autocarro da rede de expressos. Até estava algo feliz pela viagem, apesar de saber que passadas as primeiras duas horas já me estaria a revolver no banco e a queixar-me do espaço que não tinha para pôr as pernas. O tempo até estava ameno, a música foi bem escolhida – uma compilação de 1995 «Sharks Patrol These Waters, The Best Of Volume».

É facilmente reconhecível o momento em que se chega ao Algarve. Vêem-se muitas pessoas loiras e muitas peles acobreadas, de solário e de praia. Mas o percurso do autocarro é perverso e recomendo-o porque se aprende muita coisa.
Divide-se me duas partes o meu Algarve; a fronteira, essa divisão entre a ostentação e a podridão estão na Nacional 125. Da fronteira para Norte está tudo podre, entregue ao abandono e deus-dará.
Vi aquilo que em tempos foi um parque aquático, ou seja, um grande lago de cimento que as ervas começavam a cobrir. Descobri que era um parque aquático porque na berma da estrada se encontravam as tubagens onde as pessoas em tempo escorregavam com prazer, onde faziam pequenas feridas nas vértebras por passarem nos encaixes dos mesmo tubos.
Vi cafés, muitos cafés, colados, geminados, gémeos. E as pessoas têm um olhar tão vago, tão desencantado e triste. E não se atrevem a passar essa fronteira, porque do outro lado não têm lugar. Um pouco quase como o «Admirável Mundo Novo» em que o personagem principal vai a um “jardim zoológico” ver como os humanos procriam naturalmente, com sexo e fluídos. Assim vivem os habitantes do lado Norte algarvio.

Para os do lado Sul, o mar é o limite, têm barcos. E a pele acobreada de tardes de solário, e camarão e cabelos loiros e festas e jogadores de futebol.
Um dia faz-se a revolução, porque os olhares desencantados e esgazeados pelo álcool e drogas baratas já têm lampejos de ódio e raiva.

Há títulos que não sabemos dar...

Lembro-me de mim sentado numa mesa a conversar e a fumar. Não exactamente a fumar, mas a enrolar um cigarro. Vi a minha noite a passar como se dela não tivesse feito parte, quase como um filme que gosto de ver e vejo repetidas vezes. Não pela conversa que estava a ter, não pela música, mas pelo ambiente, pelo amigo que comigo estava. Só que desta vez não foram só dois dedos de conversa e uma mão de amizade. Os dedos perdi-lhes a conta e a mão transformou-se em abraço.

Para despedida soube bem a noite cálida da qual agora acordei. A conversa não muito interessa, interessa a intensidade do olhar, uma fracção de segundo a dizer: "Sabes que podes contar comigo."

Para despedida não há melhor; quando entrei no carro estava a dar um programa de heavy metal. Desliguei e fui no silêncio. Mas quase jurava que perto de casa ouvi o Camané: "Adeus que me vou embora/Adeus que me vou embora..."

E fui.

Monday, June 27, 2005

Cerejas do Fundão

Ontem ao almoço comi cerejas do Fundão. E frango assado com batatas a murro. Mas não foi isso que me deixou com a sabor a saudades. Foram as pessoas.

Fwb 48h e 40m.
Cheguei à Beira com medo do que me esperava. Quatro anos sem ir visitar amigos é feio e dá direito a um calduço bem dado, daqueles com força. Há muito que não me atirava à estrada, de carro ou autocarro, para ir estar com os amigos. A chegada: falar com as pessoas, umas que logo te reconhecem, outras que não e o comentário que mais ouvi durante a noite: "Estás feito um homenzinho, até já tens barba." Sorria porque me sabia bem sorrir aos beirões que são pessoas de quem gosto. Mas caramba malta, tenham tino, não sou muito mais novo que vocês, a minha barba é que foi semeada em dia de vento.

Fui às compras, fui deixar as compras, encontrei mais pessoas conhecidas. Não é que as pessoas não estavam esquecidas de mim? Eu não as tinha esquecido, algumas fui vendo aqui e ali, outras não me lembrava da cara, mas assim que as vi reconheci-as. Nomes é que é mais complicado. Fez-se o jantar, pôs-se a mesa, bebeu-se sangria, cantou-se, dançou-se. Podiam ter ficado as imagens em câmara lenta, ao som de The Concretes. Foi perfeita, a noite.
Conversei tanto, soube-me tão bem conversar. Fiquei longe de tudo isto durante quatro anos; foram quatro anos em que as coisas foram estranhas, em que não fui feliz, em que me escondi atrás de muitas coisas.
Um dia resolvi espreitar do meu esconderijo, olhei à volta e saí. havia um espelho à saída: não gostei do que vi. E por isso mudei.

Fui à discoteca, sai de lá de dia; fui à santa, saí de lá para ir comer pão à Flor do Fundão. (Obrigado pelo croissant da tarde, Isabéis).
A manhã há muito tinha começado quando dormi.

Acordei, foi o almoço, aquele com que comecei. Comecei a sentir o peso das horas em cima de mim, a obrigação que me levava de volta a casa. "Não podes demorar outra vez quatro anos", disseram-me. Eu sei, espero não voltar a demorar tanto tempo só para fazer cento e vinte e dois quilómetros.
Foi apenas uma caminho que fiz, não porque o tenha escolhido, mas porque tinha que o fazer. Desculpem, fundanetes.

Estive perto da piscina a gozar a sombra. Evitei o regresso o mais que pude. Guiei com o sabor a cerejas e saudades. Sinto falta destas pessoas em doses grandes. Fazem-me sentir bem.

Thursday, June 23, 2005

Imagens do Fim

Tenho uma camisola de Verão vestida, com as meias vestidas e sem calças. Da minha boca vai saindo fumo de droga que podia estar a fumar. Ao meu lado está um copo com um líquido que tanto podia ser whiskey como chá. Isto tudo acontece comigo deitado em cima da cama.
Acho que não há imagem mais bonita do degredo. Umas quantas mochilas estão espalhadas pelo quarto. Esforço-me por ver um filme, o único que tenho aqui, que está numa das gavetas do computador. Bebo um golinho da bebida que está ao meu lado e dou mais uma baforada na pretensa droga.

Deixo cair a cabeça para trás, para cima da almofada. As paredes estão despidas, porque já estiveram vestidas. O título de um livro indica-me que a vida não é aqui. Eu sei que não é. Por isso levanto-me e vou até à casa de banho. Antes de lá chegar caio no chãop do corredor. Era mesmo droga, era mesmo whiskey. O corpo não mais aguentou, colapsou com o calor com a incauta ingestão de tantas substâncias.
Contra a minha cara sinto o fresco da tijoleira e penso como é bom estar assim deitado. Com a aragem que corre, vejo pequenos pedaços de cotão cinzento a passar diante dos meus olhos. Fecho-os com força para apenas sentir o fresco da tijoleira. Mas o contacto com a minha cara tornou-a quente. As gotas de suor, caem, fazendo pequenos lagos circundando a minha cara.

Alguém me pegou pelos ombros, arrastou-me até à cama e atou-me. Tiram-me os restos de roupa, a droga e o whiskey.

Wednesday, June 22, 2005

Verão: Sangue Suor e Calor

Os meus dias estão cada vez mais vazios. Transformam-se em horas encavalitadas em minutos e estes encavalitados em segundos.
Sinto as gotas de suor que escorrem pelos flancos, umas caindo para o chão, outras absorvidas por uma toalha, a últimas conseguem descer e encontram uma camada de algodão com um padrão de sapos.

Às vezes julgo que não vou aguentar com este calor. Sinto que o meu corpo se começa a empastar, ganha uma forma disforme, uma amálgama liquefeita na qual não se distinguem ossos, massa encefálica, cabelo e mesmo unhas.

Na minha testa há uma corrida: pequenas gotas agrupam-se na raiz do cabelo, preparando-se para a corrida que as levará até ao meu queixo. Mas a prova não é fácil: há aquelas gotas que preferem ir para o nariz, sem saber que as espera um abismo: essas acabam no chão, sem ter terminado a corrida. Umas outras vão pelas sobrancelhas, mas chegando aos olhos encontram o fim da sua corrida. Por fim, as mais inteligentes e perseverantes, que começam por contornar a testa, descem pela parte lateral da minha cara, e se conseguirem passar a barba, de certeza que chegarão ao seu destino, o queixo.

E ainda há os bichinhos que gostam do meu sangue. Sei que tenho o sangue doce, já o provei. Mas não sou o único a acha-lo. A par de mim há os bichos nocturnos que gostam de dar umas trincas nos mais estranhos lugares. O pior é quando trincam sítios onde não conseguimos alcançar com as mãos para coçar e temos que nos chegar às paredes rugosas para nos esfregarmos.

Remédios: fenistil, ar condicionado e paciência.

Tuesday, June 21, 2005

Primavera Celibatária

Ontem terminou a minha vigésima terceira Primavera. Conto-as desde mil novecentos e oitenta e três, visto que fui parido como cria no final do Verão de mil novecentos e oitenta e dois.
Não é das estações que mais gosto, a Primavera. Ainda por cima se esta se torna perversa, bulindo com os nossos nervos, dando muito azo às hormonas potenciadas e provocadas pelas feromonas.

Mas nem sempre as Primaveras tiveram este efeito devastador em mim, até passava por elas com bastante naturalidade, sem necessidades hormonais de especial monta. Era uma coisa que passava por mim sem deixar estragos por aí além, não me deixava ansioso nem totalmente desesperado, como esta Primavera que ontem se encerrou. Mas outras houve em que as coisas se tornaram muito complicadas, também já ultrapassei o auge da adolescência e das cambalhotas hormonais.

E houve Primaveras que foram muito importantes, Primaveras de descoberta do corpo, da sexualidade, ou não fosse, lá está, Primavera. Na Primavera de mil novecentos e noventa e seis descobri o que era o prazer sexual. Três anos mais tarde descobri o que era o prazer sexual com uma rapariga.

Encerro esta Primavera com um sabor agridoce na boca e no corpo. Foi uma Primavera que trouxe muitas certezas, mas em que as feromonas me emboscaram com todas as suas forças e exércitos.
As certezas foram mais fortes do que qualquer hormona ou feromona. São-o porque são certezas.

Sunday, June 19, 2005

So This Is Goodbye*

Foi um fim de semana de conversa difíceis. Não que as não quisesse ter, simplesmente são conversas que se têm muito poucas vezes, conversas que mexem connosco, conversas que falam do passado, que resolvem coisas.
Num filme que há dias vi, a Julie Delpy dizia: "Memories are a wonderful thing if you don't have to deal with the past."
Ou seja, é sempre fantástico recordar para aprender, para não repetir erros; é bom aprender, mas não é nada bom lembrar o sofrimento inerente a esses acontecimentos. Daí a frase dita.

Todas as coisas têm o seu tempo, por isso não me sinto especialmente nostálgico por sair de Évora. Há pessoas de quem sempre gostaremos e essas deixam saudades. Mas as coisas têm o seu tempo e reconhecendo isso dou mais um passo em frente, prefiro não estagnar como poderia, se quisesse.

Prefiro então não recordar, as coisas têm o seu tempo. As memórias também: ni fim de uma vida só acabamos por nos lembrar daquilo que é realmente importante. Enquanto pessoa nova que sou, sei que armazeno tudo, bom e mau, importante ou supérfluo. À medida que for envelhecendo - cabelo grisalho e rugas de experiência, olhar sabedor - vou seccionando e seleccionando aquilo que foi mais importante daquilo que não interessa.
Acabo por ter as memórias e lidar com o passado que importa, com aquele que vai sempre influenciar a minha forma de olhar.
O outro, não que não seja importante, mas não interessa.


*título de uma canção de Stina Nordenstam

Thursday, June 16, 2005

Arremedos de tédio

10.30h - Acordar
10.45h - Sair da cama e tomar o pequeno-almoço
10.58h - Lavar os dentes
11.00h - Fazer dezasseis quilómetros de bicicleta
11.50h - Regressar a casa e fazer alongamentos
12.00h - Tomar banho
12.20h - Pensar no que vai ser o almoço
12.30h - Fazer compras de última hora para o almoço
12.50h - Fazer o almoço
13.25h - Almoçar
13.40h - Lavar a loiça do almoço e do pequeno-almoço
13.50h - Fumar um cigarro
13.57h - Lavar os dentes
13.59h - Dormir a sesta
15.15h - Acordar
15.30h - Sair da cama
15.31h - Ligar o computador para trabalhar
15.33h - Jogar Solitaire
16.00h - Ir beber café à tasca sem ter começado o trabalho
16.43h - Regressar a casa e começar a trabalhar
18.00h - Acabar o trabalho
18.05h - Ver um filme da Guerra das Estrelas
20.10h - Jantar os restos do almoço
20.30h -Lavar a loiça
20.40h - Ler
21.30h - Lavar os dentes e vestir umas calças
21.50h - Sair para a tasca
22.00h - Beber cerveja
00.00h - Sair da tasca para outro local
00.20h - Chegar à Sociedade Harmonia Eborense
00.30h - Pedir uma cerveja e uma macieira
01.30h - Pensar em ir embora
02.00h - Ir embora
02.15h - Chegar a casa
02.16h - Lavar os dentes
02.20h - Dormir

Monday, June 13, 2005

O roupeiro escangalhado

Dou por mim a empacotar tudo de novo. A vida que acumulei durante quatro anos volta a caixotes. Os mesmos em que veio. Lixo, lixo, lixo. Desfaço-me daquilo que tenho sem o menor pejo, deito fora coisas que em tempo achei importante guardar.

Desfaço-me de uma vida que já pouco me diz. No armário perto do computador está um documento de trezentas e dezanove páginas que me vai levar daqui para fora. No chão espalha-se lixo, maioritariamente papeis e postais, na parede um sinal roubado numa noite de bebedeira. Começa tudo a ficar despido, também eu me sinto despido e meio acabrunhado: vou deixar uma fase de quatro anos. Uma fase que não me leva à idade adulta, apenas ao pós-adolescentismo. Mas não é mau estarmos despidos, temos sempre a possibilidade de vestir uma nova roupa, ou uma mais confortável, tudo depende onde queremos chegar.

E instala-se a dúvida, minha pelo menos. Que roupa vestir? O roupeiro abre-se à nossa frente e não nos conseguimos decidir pela roupa que queremos usar, a pose que queremos assumir. A mais confortável é a mais comodista, a mais independente é a mais interessante, a mais formal é a mais empertigada e por aí afora. No cantinho do roupeiro está uma roupa que nunca gostámos muito. Aquela, que muitas vezes experimentamos em casa e nunca saímos com ela. Aquela, que todos nos dizem que nos fica bem, mas que nunca temos bem a certeza e não arriscamos; mas às vezes dizem-nos a mesma coisa tantas vezes que nós acabamos por acreditar. Quer para o bem, quer para o mal.
Vesti umas calças de ganga, um t-shirt com um boneco verde e uns sapatos vermelhos. Aquela roupa já não está no cantinho do roupeiro, está no lugar de honra, bem ao centro. À espera do dia em que vou ter coragem para a vestir porque já sei que me fica bem.

Sunday, June 12, 2005

A pergunta mais difícil do mundo do mundo

Posso fazer-te uma pergunta?

Saturday, June 11, 2005

O fim das minhas papoilas

Sinto as pernas doridas, sinto o corpo a queixar-se dos abusos dos últimos dias. Sinto que os olhos se querem fechar a cada momento, nas horas seguintes ao almoço, em que a conversa e o café encaminham para dolência das tardes alentejanas. Ganhei uma nova vista da janela do meu quarto, em vez da cidade que se entregava a meus pés, tenho agora uns quantos quintais nos quais vejo mães gordas a estender a roupa.
“Olá vizinho” gritam.

Não estou nada bem disposto, estou cansado. Respondo:
“Vá à merda, deixe-me em paz!”
Mentira, faço um sorriso amarelo e respondo “Olá” timidamente. Idiota, mal sabes que há dez anos atrás te roubava laranjas e tu me ameaçavas com a vassoura. Deixa-me em paz. Mas respondi:
“Olá, está boa? Que me diz deste calor?” Idiota sou eu, iniciei uma conversa de ocasião que detesto. E lá vou ficar debruçado da marquise a conversar e a pensar nas caixas fechadas que estão atrás de mim.

O meu quarto ficou arrumado, algumas caixas nem sequer foram abertas a pensar numa outra mudança, aquela que me vai levar para longe do alentejo.
Hoje de manhã deixei-me ficar deitado a rebentar bolinhas de ar daquele plástico que envolve o conteúdo das caixas que dizem “FRÁGIL” e a pensar numa mensagem que há dias enviei; dizia que arrumar caixas era uma boa metáfora para a minha vida actual, também me estou a arrumar por dentro. E não é que era mesmo verdade?

A vizinha já percebeu que eu não quero conversar mais, que só me encontro debruçado por boa educação. Diz-me adeus e vira as largas ancas, protuberante barriga e as mamas de amamentar para o alguidar da roupa lavada. Eu volto para dentro, triste porque já não posso ver as minhas papoilas.

Tuesday, June 07, 2005

Audio Slave

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The New Pornographers - Mass Romantic (2000)

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The Amps - Pacer (1995)

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Lemonheads - Lick (1988)

Sunday, June 05, 2005

As duas papoilas que vejo da minha janela

Voltei a espreitar pela minha janela e ver a papoilas que ali nasciam. Olhei duas desgarradas e cerca de quarenta, cinquenta juntas.
Isto é um pouco elucidativo de tudo, da minha forma de viver também, acho. Quando sobraa apenas uma papoila, vou saber que sou eu.

Pouco depois de ter escrito sobre as papoilas que da minha janela via, enviaram-me uma fotografia a uma reprodução de um quadro de papoilas.
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Obrigado C.

Dois dedos de conversa e uma mão de amizade

Ontem fumei de mais.
Estive encontado ao cantinho de um balcão, de um café pequenino a conversar com um amigo.
Programas de computador, trabalho, mestrados, carros, homossexualidade, cultura popular, Lisboa, Évora, Portalegre, mães, avós, África, racismo, vinhos, whiskey, garrafeiras caseiras dos pais, simpatia, pessoas com quem conseguimos conversar, sorrisos, vizinhos atenciosos, droga, mercearias, viagens de avião, namoradas, amigos e amigas, casamentos, possíveis filhos, ex-namoradas, situações embaraçosas.

Regado com cerveja, bem regado. Decidi-me a ir embora já o café fechava. Passaria pouco das duas horas da manhã. Cambaleante e trôpego encaminhei-me até ao carro. Sentei-me e olhei-me pelo retrovisor. Senti-me bem numa noite em que queria ter ido para casa às onze horas. A conversa fui fluindo, eu fui ficando, soube-me bem.

Guiei até casa; deitei-me e dormi.

Wednesday, June 01, 2005

As coisas que não me acontecem por acaso

Chegado de um bar a que não queria ir. Encontrei uma pessoa que não esperava encontrar.
Há alguns meses atrás tinha o hábito de ir a um clube, uma espécie de sociedade resistente dos tempos da ditadura. Hoje em dia não tem nada a ver com isso; transformou-se no extremo oposto, é um local onde se encontram os pretensos intelectuais e artistas, drogados que não têm onde cair. Gosto de lá ir, pelo ambiente, pelas fotografias, pelos bancos e pelos sofás, pela convidativa varanda que cheira flores quando chega a Primavera.
Houve uma altura, há alguns meses atrás que fechou. Obras, edifício antigo - com capela e balneário - remendos no tecto e numas outras salas que estão vedadas aos não-sócios, tal é a minha condição. Continua a ser um clube, os critérios de admissão é que se alteraram.
Quando fechou passei a ir a outro bar. Uma espécie de tertúlia de esquerda, onde mais uma vez se encontram os pretensos intelectuais e artistas, despejados do anterior local. Nesse mês de interregno, reparei numa das barwoman. Uma mulher bem mais velha. Sorria-me sempre e eu sorria-lhe de volta. Uma vez teve a ousadia de me piscar o olho; dessa vez eu sorri e tive a ousadia de lhe responder ao piscar de olho.
Arrastaram-me a um bar a que não queria ir. Não porque estivesse embriagado ou que quisesse beber mais. Não tinha sono e apetecia-me continuar na rua, eis as razões pelas quais acedia entrar em tal antro. Encontrei essa mulher que me piscou o olho; respondi. Estivemos alguns minutos de conversa, entre sorrisos.
E fui-me embora, prometeu pagar-me um copo no local onde trabalha.